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Para especialista, inclusão deve guiar modelo de TV digital

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Mauro Pimentel

A nova tecnologia de transmissão de sinais de TV foi tema de um dos 38 livros lançados no XIX Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas em Pós-graduação em Comunicação (Compós 2010), realizada de 8 a 11 de junho na PUC-Rio. Em “TV Digital, Economia Política e Democracia”, organizado pelo professor da Unisinos Valério Brittos, 12 textos dialogam com o futuro da televisão no Brasil, quando a revolução da TV digital estiver em pleno funcionamento. Em 2007, 17 cidades, incluindo o Rio de Janeiro, receberam o sinal digital; e até 2012 o processo estará concluído em todo o país, com a aposentadoria do sinal analógico. Os principais efeitos desse admirável mundo novo, especialmente os proporcionados pela interatividade, devem demorar um pouco mais para tornarem-se efetivos. Ainda assim, é possível prever um reforço significativo à inclusão digital de milhões de brasileiros, afirma Valério. Em entrevista ao Portal PUC-Rio Digital, o especialista explica por que a nova tecnologia tende a ser essencial para a inclusão  – “desde que a sociedade cobre investimento público contra a exclusão”  –, aponta caminhos para transformar em prática o discurso da interatividade e conta como foi a organização do livro récém-lançado.

Portal: Qual a principal questão abordada no livro?

Valério: Acho que a grande preocupação dos textos que compõem o livro é a construção de um padrão estético alternativo. Uma outra forma de fazer audiovisual alternativa ao padrão hegemônico. Uma alternativa que fale de outras questões, com abertura para diversidade; e a baixo custo, para que a própria sociedade possa fazer audiovisual, e participar dessa arena midiática, independente dos grandes conglomerados de mídia. Este é o nosso grande desafio. Acreditamos que seja possível com a prática desse padrão técnico estético alternativo.

P: O que o senhor acha do modelo de TV implantado pelo Brasil?

V: O Brasil poderia ter construído um outro modelo de TV digital. Mas, diante do que foi definido, a solução é apostar na interatividade. Pesquisadores e a sociedade têm que se mobilizar a favor da instalação do ginga – software que garante a interatividade – em todos os conversores, televisores e celulares. Além disso, tem que se definir um canal de retorno para se ter uma interatividade plena. Se o Brasil conseguir isso, teremos um grande avanço. Será possível, por exemplo, realizar votações de governo e marcações de consultas pela TV digital. Mas a interatividade, por enquanto, é só um discurso.

Mauro Pimentel

P: Como será a interatividade no Brasil e o que falta para se tornar realidade?

V: Para a interatividade simples, basta que se tenha um software, no caso o ginga, que será instalado no conversor e no televisor. Assim, o usuário poderá receber os conteúdos via TV e interagir. No caso da interatividade avançada, é preciso de um canal de retorno – que leve o sinal do receptor (casa) até o operador de televisão (emissora). Só assim, ele [o usuário] pode dar uma resposta, responder uma votação, marcar uma consulta, pedir determinados conteúdos e até mandar conteúdos para a televisão, como um pequeno vídeo. Mas é preciso investimento público, porque o canal de retorno tem que ser uma rede sem fio e gratuita. Se for paga e com o preço alto, exclui uma grande parte de população. A gente tem que lutar por isso agora.

P: Qual a posição do Brasil, em relação aos outros países, na implantação da TV digital?

V: É difícil criar um parâmetro de comparação com outros países. São modelos diferentes. No caso dos EUA, por exemplo, 90% da população recebe televisão por sistema fechado, e isso se reflete no formato de interatividade, de distribuição de conteúdo etc. Como o Brasil tem uma condição específica, acaba sendo um grande laboratório. Porque nenhum país, das dimensões do Brasil e com os problemas como os nossos, passou por essa transição do analógico para o digital, em termos de televisão. O Brasil é um caso atípico: tem pouca TV por assinatura, tem um grau de exclusão da sociedade digital, é um país grande em território e é um grande produtor de conteúdo audiovisual. Podemos desenvolver um modelo a ser seguido, pela Índia, por exemplo, e outros tantos.

P: A interatividade é vantajosa para as grandes empresas de produção de comunicação?

V: O modelo interativo de TV digital é vantajoso economicamente para as empresas de produção de comunicação. A principal vantagem é mesmo a possibilidade de inclusão social: atores sociais que estão fora do mundo digital passariam a participar desse mundo via TV digital. Ao mesmo tempo, ele é vantajoso para as emissora de televisão, porque representa a produção de mais conteúdos que, como se diz, vão fidelizar o público. Se as pessoas tiverem conteúdos mais interativos, elas tenderão a consumir mais TV. Este é o novo desafio da televisão, até para não perder público. 

P: As pessoas que passarem a produzir conteúdo serão consumidores-produtores. Qual o perfil desses “atores”?

V: Vários públicos devem participar deste processo, mas a gente tem se preocupado especialmente com o público jovem, o universitário. Porque quanto mais jovem, mais preparado para o novo, mais tem vontade de fazer diferente, de participar dessas questões, e já tem algum grau de relacionamento próximo com a mídia. O universitário torna-se, assim, o principal público para participar desse processo. Logicamente, os alunos de comunicação – jornalismo, publicidade, cinema, relações públicas – se interessam mais, pois têm um conhecimento técnico adquirido.

O admirável mundo novo da nanotecnologia

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Mauro Pimentel

A nanotecnologia aproxima o dia a dia da ficção científica. Aplicada, por exemplo, numa tinta capaz de regenerar-se automaticamente ao ser arranhada ou provador artificial de café, a manipulação de partículas com um bilionésimo de metro – quase invisíveis – cria produtos impensáveis, como um nano-robô que encaminha o remédio diretamente ao local da infecção, no interior do corpo humano. Nesta escala, uma bola de futebol é tão grande para uma partícula dessa como o mundo é para a bola de futebol.

Ainda não é possível para o corpo humano ficar do tamanho de uma partícula em escala nano, como fizeram os médicos do filme Viagem Fantástica, de 1966, mas o conceito da atuação no local da doença foi antecipada pelo roteiro. Com a técnica do “carreamento de fármacos”, evita-se uma intoxicação de outras partes do corpo pelo remédio. Embora grande parte dos estudos sobre nanotecnologia seja voltada à área da saúde, as aplicações estendem-se a diversos setores, desde usos prosaicos até sofisticados, como para a extração de petróleo. O professor Marco Aurélio Pacheco, do Departamento de Engenharia Elétrica da PUC-Rio,  observa que as pequenas empresas podem conduzir o processo inovador:

– As grandes empresas estão utilizando a nanotecnologia nas áreas de petróleo ou exploração de mineiras. O desenvolvimento de novos produtos fica a cargo das pequenas empresas.

Especialista neste tipo de pesquisa, Pacheco esclarece que os produtos desenvolvidos com nanotecnologia tendem a facilitar a rotina, mesmo sem representar necessariamente uma grande mudança. Por exemplo, um líquido que, borrifado nas janelas, faz a luz do sol desprender a sujeira do vidro. Assim, a água da chuva leva os resíduos embora. A tecnologia dispensaria, portanto, a limpeza manual da janela.

– O produto vai fazer sucesso, porque ninguém vai querer mais limpar as janelas – prevê o professor.

Segundo o professor, a produção de tintas “inteligentes” também recebe investimentos crescentes em nanotecnologia. A nova geração de tintas deixa a superfície mais lisa e recupera automaticamente o estado original, em caso de dano. Uma auto-cicatrização.

Além de remédios, produtos de limpeza e tintas, os alimentos também correspondem a um campo de aplicação potencial da nanotecnologia. Diversos estudos dedicam-se a melhorar a produção, tanto na quantidade, quanto na qualidade do plantio.

Em dois anos estará no mercado um revestimento feito de nanopartículas de prata que envolverá os alimentos e bloqueará a ação de bactérias, e assim diminuirá o desperdício. Um outro exemplo, ainda no setor de alimentos, flerta com a ficção: a Embrapa desenvolve, desde 2005, uma lingua eletrônica. Nanosensores, mais aguçados do que a lingua humana, avaliam a qualidade do produto. O provador artificial foi desenvolvida inicialmente para o café e começa a ser adaptado para analisar a qualidade das laranjas.

Capacitação profissional

Se na décade de 80 Bill Gates “criou” a Microsoft numa garagem, seria improvável algo do gênero no inovador mundo “nano”. O desenvolvimento desta tecnologia exige estrutura de ponta – como equipamentos caros – e pesquisa aprofundada. Na PUC-Rio, os estudos concentram-se na pós-gradução, que serviu de base para a criação de duas empresas especializadas, ainda em fase de concepção. A partir do próximo semestre, a univeridade oferecerá o curso de Engenharia em Nanotecnologia.

“A formação de novos profissionais com acesso a equipamentos e à cultura empreendedorista da PUC são ingredientes para aproximação entre empresa e universidade”, ressalta o professor Omar Paranaíba, doutor em nanotecnologia. Segundo ele, o profissional de nanotecnologia terá “uma área de atuação imensa”. A capacitação inclui conhecimentos da maioria dos segmentos da engenharia (mecânica, elétrica, química, genética).

Estudos analisam os efeitos

Mesmo com a promessa de revolucionar o cotidiano das pessoas, os produtos produzidos a partir de nanotecnologia não têm futuro garantido. Estudos buscam ainda precisar os efeitos das partículas. Como são menores do que as células humanas, há o receio de que as entrem nestas células, comprometendo a saúde. O professor Marco Aurélio Pacheco pondera:

– Certamente que há riscos – como em toda nova tecnologia -, mas, até o momento, nada significativo. A minha sensação é a de que a nanotecnologia é uma mina de achados – entusiasma-se.